quarta-feira, julho 13, 2005

De onde se via a outra margem

Havia um muro - não de se pegar, mas havia - que não cortava o vento nem a vista, mas parava as mãos, entortava os caminhos, guilhotinava as palavras. E cresceu para lago, onde os pés testavam covardes a mordida do frio e cancelavam a travessia. E nem aves nem insetos vinham beber no espelho, nem o sol lavava a multidão das pequenas ondas. E as mãos confirmavam a aspereza da areia da margem, e espalhavam os grãos, semeando chão em si mesmo. E os olhos traíam o corpo e, no menor dos descuidos, já estavam além da água, brincando na paisagem impossível. E cresceu para horizonte, que é um muro entre duas miragens. E a imaginação, esse monstro de mil bocas, abandonava os olhos e o corpo, lançando-se além da linha da vista, retornando relatórios que enchiam de garras e sombras a obesidade pronunciada de um vão intransponível.

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