domingo, agosto 07, 2005

Borrow somebody´s dreams ´till tomorrow 5 ou A Bailarina do Veneza

Folhas secas entram revoando em redemoinhos pela esquecida janela aberta. Sobre a escrivaninha, alguns poemas escritos à mão escorregam para o piso, impelidos pelo vento de agosto. Setembro nem começou e já é interminável. Lá fora, as árvores dançam e, se alguém passasse na rua nesse instante, perguntaria se não são elas que agitam o ar que agora beija o rosto do jovem de olhos fechados, deitado em sua cama. Aproximamo-nos dele. Olhamos por seus olhos que vêem o que não podemos chamar certamente de sonho.

Haniel vem por uma rua do centro. Mãos dadas a uma moça de amarelos e negros cabelos e olhos, seria chamada Circe. Olha-a e quase mesmo acredita que ela está ali. Como se não tivesse ido embora, em um dia que a lembrança insiste em esconder. Talvez até ela não tenha sido tão bonita como agora lhe parece.

Na verdade, ele sabe, ela era ainda mais bela. O andar tem fim. Chegam à frente do Cine Veneza. Circe corre à bilheteria. Haniel pensa a tarde e como parece com outra, de muito tempo atrás. De novo, a apagada lembrança. “Balas?” Soa uma voz em suas costas. Gira no pé direito e vê a bailarina, rosto maquiado branco, com ressaltados traços a lápis preto. Roupa colante num corpo esguio. Na altura da cintura, um tabuleiro de guloseimas, pendurado à nuca por uma correia. “Quer balas?”

“Haniel!” Circe chama, acenante, da entrada, agitando na mão os bilhetes. As pessoas entram devagar, parecem estranhas, como se já as tivesse visto. Ah... memória... Como se as visse por toda a vida. A voz aveludada da bailarina parece espalhar-se no ar. “Ela não é real, você sabe. Eu sou, de uma forma diferente, mas sou, agora mesmo a lembrança tremeluz em você.” ele olha de novo a menina loira. Como foi mesmo? Há tanto tempo...

Lembra que a namorou por quase um ano, depois de outro de devota admiração. Tudo em sua vida passava por ela, como um filtro, o fundo de uma piscina. Lembra que gostava de encostar em seu pescoço e ali ficar, por muito tempo sentindo o cheiro de flor que transpirava. Circe, um dia, disse acabado tudo. Que não era ele quem ela queria, que não se vissem mais. Ele insistiu, pelejou, mas estava decidida, concreta e não a abalou nem mesmo quando caiu menino aos seus pés. Cerrada em sua decisão, de onde quem sabe originada, ela irredutiu-se. Enfim, como que conformado disse “Vou me lembrar para sempre de você” Ao que a moça respondeu, dando-lhe as costas para nunca mais: “Eu espero que não”.

“Balas?”

Olha para baixo, não, não quer. Na porta da sala de projeção, a menina loira sumiu. “Ora, mas se você não quer, o que veio fazer no cinema? Assistir a um filme? Você já viu todos.” Onde ela está , quer saber. “Ela não existe, já falei. Ficou para trás como as outras pessoas. É uma outra lembrança que já de novo perde-se aí dentro. Vamos, aqui a mão.” O rapaz enxuga a vista e estica o braço. Um arrepio lhe relampeja o corpo quando sente os dedos frios e magros tocarem os seus. “Calma, agora podemos ir, está pronto?” Ele não sabe se está, mas faz que sim com a cabeça. Ela sorri docemente, e passa-lhe a outra mão nos cabelos lisos. E assim, Haniel desce a calçada com a bailarina do Veneza que vende balas de verdade.

Chuviscos entram pela janela, molhando o chão. O tempo parece que vai piorar, talvez chova muito nos próximos dias. Uma folha marrom entra rodopiando pelo quarto e interrompe sua trajetória pousando no peito do rapaz deitado. Sua mão solta de lado da cama toca o piso, dela escorre um líquido denso e vermelho formando uma poça, que vai aumentando de tamanho, prejudicando, de maneira irreversível, o caríssimo carpete bege.

1 comentário:

Anónimo disse...

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